terça-feira, 22 de abril de 2008

Homem público e as Drogas


“Droga não atrapalha minha vida. O que me atrapalha é corrupção e violência”.

Marcelo Antony, referindo-se ao episódio em que foi flagrado, em 2004, comprando maconha em Porto Alegre.


Interessante, na fala do ator da Rede Globo, é o tempo de conjugação do verbo que se utiliza para fazer referência ao episódio de 2004. O presente. Ele acha que não atrapalha, mas será que não? E... se não atrapalha a sua, será que não atrapalha a vida de outras pessoas? Melhoro a pergunta: será que não atrapalha a vida das pessoas comuns, que moram nas favelas onde se vendem drogas? Será que o tráfico, conseguindo fazer sua roda girar (se capitalizando) atrávés das pessoas que são consumidoras de drogas, não prejudica a vida das pessoas que sofrem com as balas perdidas, os caveirões, as guerras entre facções rivais? Se o tráfico figura como um negócio altamente rentável, na favela, será que isso não prejudica a formação de uma criança que vive em estado de miserabilidade, sem perspectivas na sua vida, e que escolhe começar como "vapor" do tráfico? Será que os custos sociais do tráfico (quero me referir somente ao custo em saúde pública e segurança por conta dos efeitos da violência) não prejudicam o ator da Globo? Esses custos sociais aumentados são divididos entre a população através de impostos que todos pagamos, que financiam os hospitais e as políticas de segurança pública. Será que esse ator se sentirá confortável e seguro se, daqui a uns anos, os seus filhos, por conta de um eventual vício das drogas, se enterrem de tal maneira nele que se degradem física e moralmente a ponto de beirarem o abismo da loucura? São tantas questões que poderiam ser colocadas...


A corrupção atrapalha muito mesmo! Mas corrupção de quem? Será que as vezes não somos corruptos? É só a corrupção do outro que nos afeta? E nossa participação política, acompanhando, sendo um cidadão crítico da atuação dos dirigentes e parlamentares, fiscalizando-lhes o trabalho e discutindo essas questões para multiplicar esforços... temos feito isso? O que temos feito contra a corrupção?


A violência atrapalha também, demais! Mas... em que medida nós, que nos pensamos cidadãos de bem, de alguma maneira não alimentamos esse estado de violência em que vivemos? Será que a violência que nos afeta tanto não possui lastro social, ou seja, em outras palavras, é cultivada e aceita por uma grande massa. Tantas cenas de brigas nas ruas, nos lares, tantas mortes na mídia, tantos filmes violentos... cultivamos tudo isso. O que temos feito para conter a violência?


Essas questões, caro ator global, não estão descoladas da sua vida nem da de ninguém.


Para encerrar, depois que lí sobre a declaração acima, recordei-me de um debate que realizava-se na Uff, no bloco N, ano passado acho, sobre drogas e legalização. Quando estava saindo de uma aula, indo para a casa, um dos debatedores, acho que um parlamentar, defendia a liberação das drogas argumentando que, com isso, estaria esvaziando o lobbie da indústria armamentista, que precisa da criminalização da droga e do combate armado para vender. Me retirei pensando nisso... achei que era um argumento forte, apesar da minha posição contrária. Depois, no caminho, refletindo com mais calma, pensei: Em que medida a liberação das drogas não pode ser vista como um lobbie das indústrias farmacêuticas para faturarem com isso? Se não me falhe a memória, Eduardo Galeano, em um texto seu, chamou a atenção para um ponto interessante e provocativo que vem de encontro com o que eu penso. Ele diz que, apesar dos EUA atacarem (assim se colocam publicamente) o tráfico de drogas, não impedem que seus laboratórios vendam substâncias que ajudam no refino das drogas para os países da América do Sul. Não me atrai defender interesses de fabricantes de armas nem de laboratórios.


Há... e sou contra tudo que aliene os seres humanos. Não precisamos de bengalas psicológicas para viver!

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