quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Algumas reflexões sobre o MST

PESCHANSKI, João Alexandre. A Evolução Organizacional do MST. Dissertação de Mestrado em Ciência Política. São Paulo: FFLCH/USP. 2007.

Analisa a evolução organizacional do MST, de sua formação até o ano de 2006. Trabalha com duas hipóteses, a primeira defende que a organização do movimento resultaria de uma combinação entre os objetivos dos sem-terra, os riscos e as oportunidades de cada situação, além da atuação das lideranças, cujo perfil considera importante analisar. A segunda propõe que para a continuidade do MST é decisiva sua capacidade de se reinventar, levando em conta as mudanças que lhe são externas.

No período inicial do movimento, teria sido fundamental a participação de grupos católicos progressistas, estimulados por uma leitura social da religião, inspirados na Teologia da Libertação. Teriam atuado como defensores e articuladores de mobilizações camponesas em vários Estados. Quando o movimento se formaliza, estes setores do Catolicismo teriam se afastado, em função das novas circunstâncias políticas geradas pela redemocratização. Vive-se, então, um período de alguma confusão organizacional até formularem a Direção Nacional.

Na década de 1990 a DN (Direção Nacional) se torna pouco aberta a novas lideranças, em função dos enfrentamentos com o Governo Federal. Com a eleição de Lula, a direção se reinventa para dar conta da nova realidade política, tendo como resultado mais concreto a abertura a novas lideranças. O MST mantinha fortes vínculos com lideranças do PT desde o seu surgimento, participando, de 1988 à 2002 da campanha para consolidar o nome de Lula para presidente.

Outro fenômeno que leva à mudança na composição recente da DN é o crescente protagonismo feminino. Durante sua história, esta instância fora pouco aberta a mulheres. Em 2006, adota a política de reequilíbrio de representação de gênero. O autor aponta, por fim, uma tendência à radicalização dos protestos por parte das mulheres.

RIBEIRO, Suzana Lopes Salgado. Tramas e Traumas: identidades em marcha. Tese de Doutorado em História Social. São Paulo: FFLCH/USP. 2007.

A autora analisa o processo de constituição das identidades, por meio de experiências de vida, que envolvem o MST. Além disso, busca apreender a aplicação da história oral como forma de produção e análise, na maneira de se memorizar e narrar, e as relações estabelecidas entre sujeitos (entrevistador e entrevistado). Tratou conjuntamente de da história oral e das identidades sem-terra porque, para ela, experiência e memória são essências do narrar e identificar.

Trabalhou, no começo, com 47 entrevistas, realizadas durante a Marcha Nacional, que ocorreu de 1° a 15 de Maio de 2005. Desse universo, selecionou 8. considera ter sido fundamental ter participado desta Marcha para entender a formação das identidades.

A experiência de exclusão seria, para ela, fundamental para entender a construção das identidades sem-terra. Falando disso com os entrevistados, refletiu-se sobre as questões de cidadania e da democracia, por serem inclusivas do indivíduo no mundo político. A marca dessa inclusão, para os narradores, é a diferença de vida antes e depois de conhecerem o MST.

O MST, aliás, não seria igual para todos, porque é interpretado de diversas formas por seus componentes. Não existiria, assim, uma identidade sem-terra única, como algumas lideranças teriam desejado, mas sim identidades que o compõem, em sua diversidade.

A vida privada/familiar, no geral, não faz parte das entrevistas, que possuem caráter mais militante/profissional. Existe um fascínio, por parte dos narradores, com relação à organização e pelo tamanho do movimento. Ser homem e ser mulher, no MST, são coisas bastante diferentes. Há, ainda, uma estrutura machista, que faz com que a participação feminina, da Direção Nacional às fileiras da Marcha, seja minoritária. Ser negro, indígena ou branco também implicaria em diferenciações. Além disso, a educação também é marco de certa hierarquia. Não por acaso, é apontada como importante pelos narradores, uma vez que a tomam como ferramenta para a superação da exclusão social.

SILVA, Benedito Cândido. A luta na terra em busca da emancipação. Histórias orais de vida de agentes do MST do Assentamento Dorcelina Folador, no município de Arapongas, Estado do Paraná. Dissertação de Mestrado em Ciências Sociais Aplicadas. Paraná: UEPG. 2007.

Trata-se de um estudo de caso que busca sondar o nível de emancipação e inclusão social atingidos, na visão dos agentes pesquisados, após o ingresso no MST e a conseqüente conquista da terra.

Observou forte influência da Igreja Católica na formação das identidades da maioria das narrativas. A idéia de emancipação, assimilada pelos agentes alvo da pesquisa, apresenta-se, mais do que conquista da terra, a apropriação de maior esclarecimento sobre aspectos da conjuntura atual e a evolução na consciência de direitos de cidadão.

A escolha do método de investigação foi motivada pela obra “Vozes da Marcha pela terra”, de Santos, Ribeiro e Meihi, que é um registro de histórias orais de vida de alguns integrantes do MST, participantes da Marcha Nacional por Reforma Agrária, Emprego e Justiça, realizada em Abril de 1997.

Pretende oferecer a possibilidade de ser dirigido o olhar para o mundo e a sociedade na perspectiva do lavrador que se propôs a lutar para conquistar seu pedaço de terra, justificando essa luta em função de garantir um mínimo de segurança a si mesmo e a sua família, além de conhecer como esse lavrador se vê no contexto social. Até onde ele se insere e até onde diverge da sociedade, como lida com as influências da ideologia do movimento em contraponto com a ideologia dominante.

Entrevistou 3 homens e 3 mulheres para avaliar as perspectivas de ambos os gêneros. A escolha não foi decidida pelo pesquisador, mas em reunião dos coordenadores dos setores de educação e cultura do Assentamento.

O fio condutor das entrevistas foi a trajetória de vida de cada um, antes e depois de ingressarem no MST, o que lhes motivou o ingresso, suas lutas, sucessos e fracassos, suas perspectivas e dificuldades enfrentadas após a conquista da terra. As falas dos entrevistados foram divididas em temas, segundo o autor para facilitar o estabelecimento de relações entre elas. Os temas são: Apresentando os sujeitos; A Igreja como determinante no ingresso ao MST; Emancipação e sentimento de dignidade; A questão de gênero; As lutas.

Os pesquisados demonstraram vivo interesse em conhecer o resultado final da pesquisa, na expectativa de que possa contribuir para reflexão e aperfeiçoamento de práticas, ainda que o objetivo da pesquisa não seja de intervenção, como declara o autor. A escolha por militantes foi no sentido de avaliar os aspectos motivadores da militância e seus reflexos dentro da comunidade. Apesar das dificuldades que suportavam, o sentimento que os entrevistados deixa transparecer é o de terem conquistado emancipação e dignidade de cidadãos.

2 comentários:

Suzana disse...

Foi com muita alegria que li o comentário feito sobre minha tese "Tramas e traumas: identidades em marcha". Primeiro, pois nunca temos certeza de que alguém gostou ou achou útil o que escrevemos. Segundo pois é bom ver nossas ideias indo em frente, principalmente por fazer parte de um blog que está "transformado o mundo"!
Obrigada pelo carinho! Passarei sempre por aqui para aprender um pouco mais!
Abraços,
Suzana L. S. Ribeiro.

reflexão disse...

Que existe um injustiça social no Brasil é fato. E que pouco se faz para pelo menos entender as raízes de todas esta injustiça também é um fato. Muitos criticam o liberalismo e o neoliberalismo. E estas crítica são bem fundamentadas. Mas, atualmente, também é um fato que a solução destes problemas sociais não está na mão dos pensamentos de esquerda. Hoje se sabe que a corrupção está tanto nas esquerda como na direita. E a esquerda se mostrou muito corrupta.
O melhor entendimento do MSt não é movimento sem terra. É Muitos Sem Trabalho. E a questão é justamente esta, por que estão sem trabalhos? Nem sempre é culpa só do indivíduo. Mas, é muito fácil colocar a culpa só no individuo. Esta é uma forma de individualismo dos que aponto o dedo. E também esta questão da moradia também não é um assunto fácil. Mas, hoje se sabe que estes movimentos não são a solução para este problema. Muito pelo contrário, também estão reforçando este problema. Mas, um motivo para os apontadores de dedo. A esquerda aponta para a direita e a direita aponta para a esquerda. E a solução fica fora da caverna.